sexta-feira, 30 de março de 2007

Humanidade VS Produtividade

Sou jovem. Sou qualificada. À minha volta existem outros jovens como eu: qualificados e explorados.

Como motivar os jovens portugueses para a elevação da sua formação se ao mercado de trabalho apenas interessa a sua fragilidade?! A evidenciá-lo temos, no discurso do Sr. Ministro da Economia, argumentos surpreendentes e lamentáveis de motivação ao investimento estrangeiro em Portugal: baixos salários e fraca capacidade reinvindicatica por parte dos sindicatos...

Como jovem trabalhadora, não aceito estes argumentos. Sobretudo, recuso-me a aceitar o gigante de capital e desumanização do trabalho em que as empresas de trabalho temporário se estão a transformar, em detrimento da qualidade das condições laborais.

Fui apresentada a esta realidade de imoralidade e ilegalidade no fim de Janeiro deste ano através da empresa de trabalho temporário Multipessoal. Acabei por ser colocada, por intermédio desta, noutra empresa, a Contact (Es Contact Center - Gestão de Call Centers SA), em Cabo Ruivo, Lisboa, como operadora de call center. E sou então confrontada com a primeira situação anormal: a demora na realização dos contratos, de formação e de trabalho, que aconteceram somente após a segunda semana. Fui, fomos, eu e mais alguns, durante onze dias, mais uma sombra que engordou a tal entidade invisível, os ELES. Uma sombra ilegal, sem direitos. Apenas deveres. Caso alguma fiscalização (se existisse por ventura alguma não conivente com o sistema corrupto actual) surgisse nesta empresa como justificariam a minha presença ilegal e a de outras tantas sombras? Tios, irmãs, cunhadas, primos, enteadas?... Familiares bondosos que se disponibilizaram voluntariamente perante um acréscimo pontual de serviço?!

Hilariantemente, no dia em que assinei o contrato acabei por ser despedida, tal como cerca de outros vinte trabalhadores. Faltavam quinze minutos para o fim do turno. Uma das chefes de equipa reuniu a maior parte dos eleitos para o despedimento numa sala e cumpriu, submissa, o que lhe haviam ordenado: informar que naquele minuto preciso, e nos restantes que se seguiriam, não seriam mais necessários...

Pronto. É muito fácil despedir. Cada vez mais. Até mesmo nas escadas do metro... É verdade... O meu nome estava no fim da lista... Esqueceram-se de mim... Por sorte, a tal chefe de equipa ainda me encontrou a tempo no metro... Por sorte...! A moral da história? A moral? Era uma vez....

Quero ainda denunciar outras práticas que considero ilegais e imorais. Como a contradição entre o conteúdo do contrato de formação e a metodologia praticada. Passo a explicar: de acordo com o referido contrato, a formação duraria 5 dias e estaria dividida entre teoria e prática, sendo que esta última seria desenvolvida por meio de simulações, ou seja, de exercícios fictícios, fingidos, de imitação da realidade. O que acabou por acontecer foi o aproveitamento dos formandos em contexto real de trabalho, isto é, no segundo dia de formação estávamos já a produzir, realizando estudos válidos e reais... sem qualquer vínculo laboral...

Como o pagamento por meio de senhas de desconto, em locais de consumo vários (nomeadamente o Carrefour), de horas extraordinárias, solicitadas e liquidades pela Contact, sem o conhecimento da Multipessoal ou das outras empresas de trabalho temporário, essas sim, as únicas entidades legais responsáveis pela remuneração dos recursos humanos. Dado que as empresas em causa cobravam à cabeça e de acordo com as horas de trabalho de cada indivíduo, esta tinha vindo a ser uma estratégia descarada da Contact para poupar uns trocados... completamente à margem da lei!

Como a remuneração miserável oferecida, directamente proporcional à precaridade do contrato de trabalho... Direitos? Dignidade?...
Assim engordam os que defendem a produtividade de um país sem lei nem moral.

7 comentários:

Sónia disse...

Infelizmente o nosso país está cheio de exemplos como aquele que acabaste de contar e dou-te os meus parabéns por teres tido esta ideia de criar este espaço onde o tema da precaridade do trabalho temporário poderá ser debatido e onde a troca de experiências poderá dar-nos ideias sobre a melhor forma de lutármos contra esta epidemia e desrespeito.

Anónimo disse...

Bom dia Marta,

Penso que deves fazer queixa à inspecção geral do trabalho ou outra instituição que seja mais indicada. Este tipo de situações, mesmo que se comece a generalizar, têm que ter eco numa instituição publica! Esta situação é inaceitável! Este tipo de exploração tem de ser denunciado junto das entidades competentes. Empresas como essas das quais falas têm de ter receio de explorar desta forma!
Coragem!

Anónimo disse...

Olá, Marta!
Parabéns pela bela ideia que tiveste em criar este blog destinado a um tema tão preocupante da nossa sociedade. Talvez o segundo mais importante a seguir à saúde.
O emprego temporário e precário que a nossa sociedade enfrenta e que afecta mta gente, principalmente pessoal jovem (a nossa geração). Lembro- me há uns anos sermos chamados de geração rasca! Enfim, queimámos tantas pestanas e...
Casos como o teu têm de ser denúnciados! Nada como falares com inspecção geral do trabalho.
Vou divulgar o teu blog!!! Para que a este espaço cheguem mais (infelizmente) histórias como esta.

bjs e abraços da Rita Cipriano

Anónimo disse...

boa Marta
Este tipo de casos é cada vez mais frequente.
O que é pouco frequente é a critica, a indignação e não ficar parad@, aceitando estas coisas como invevitáveis.
Por isso continua e parabéns.

Anónimo disse...

Pois é...infelizmente estas situaçõe fazem parte do dia-a-dia de muita gente e sobretudo muitos jovens. E o problema é que as pessoas acomodam-se e aceitam, o que torna isto numa bola de neve...pois há sempre quem aceite! E ainda para agravar esta situção, publicam artigos em cadernos de jornais conceituados como o Expresso Empregos, em que dizem que o futuro de Portugal está no trabalho temporário...Mas se esse é futuro, como é que vamos organizar as nossas vidas, se nunca teremos certezas se no próximo mês teremos dinheiro para pagar as prestações e ir ao supermercado...Como é que querem que se pense em bébés?Se não há dinheiro não há bébés...se não há bébés a parte activa da população diminui, se ela diminui não há reformas nem decontos para a segurança social...é uma bola de neve que parece não fazer pensar os nossos políticos ...só se importam com os seus "tachos"!
Força Marta! ;)
Joaninha

Rita Cipriano disse...

"Mas se esse é futuro, como é que vamos organizar as nossas vidas (Joaninha)" .
É mesmo isso! Não estabilidade!E, sem estabilidade como é que as pessoas vão criar os filhotes?

Bjs

Anónimo disse...

Caríssimas,

Depois de, atentamente, me ter deliciado com os V. comentários, gostaria de aproveitar a oportunidade e o tempo de antena para deixar um comentário:

- Embora V. pareça utópico, saibam que está na mão de cada um saber valer os seus direitos no momento certo. Reivindicar o que nos é devido é uma obrigatoriedade que todos devemos ter instituída, sob pena da irregularidade se tornar rotina e da nossa inactividade se consumir em "queixinhas" e lamentos. Por isso, continuem com estas importantes chamadas de atenção mas façam também por não baixar os braços. Compactuar com situações como as descritas é ceder ao "sistema". Actuem na V. esfera de acção!Façam BARULHO! Eu faço. Dei o salto e sou feliz. No fim do dia, não é isso que conta?